Especulação de terras pressiona jovens agricultores no leste da Alemanha

De:  Florence Schulz - (Euractiv.de )

 

No leste da Alemanha, jovens agricultores têm, cada vez mais, dificuldade em comprar terras porque a maioria dos investidores não compra terrenos para fins agrícolas e as antigas cooperativas da República Democrática Alemã (RDA) estão a ser privatizadas. Não é numa terra de alta qualidade que os agricultores da quinta de Bienenwerder, na zona este de Berlim, estão a produzir legumes. Não só porque o solo de Brandemburgo oriental é arenoso, mas também porque os últimos dois verões ficaram marcados pela seca. Julia Bar-Tal está orgulhosa do que criou com a sua equipa da quinta nesta área, cultivando vegetais biológicos em 45,5 hectares e vendendo mais de 40 diferentes culturas para lojas em Berlim. Esta quinta biológica implica um grande trabalho, levando os agricultores a tratar o solo com cavalos e póneis, de modo a preservá-lo. Bar-Tal possui estes 45 hectares devido à sua ascendência. A sua avó tinha terras no noroeste de Brandenburgo, que foram expropriadas na RDA. Isto deu a Julia Bar-Tal benefícios contratuais que lhe permitiram comprar a maior parte daquela terra arável, a um preço preferencial. “Foi apenas sorte de família. Para muitos outros jovens agricultores não existe a possibilidade de conseguir uma terra, independentemente da sua formação”, explicou Bar-Tal. Esta realidade deve-se ao aumento dos preços das terras nos últimos 15 anos. De acordo com dados oficiais do Governo alemão, o preço por hectare de terra em Brandemburgo foi de, em média, 2.500 euros em 2004. Já em 2017, este valor subiu para 11 mil euros, o que se justifica com a espiral de preços que começou alguns anos depois de reunificação alemã.


Terra cara


Com o fim da RDA, as grandes cooperativas estatais de produção agrícola foram desmanteladas e privatizadas. Até hoje, a empresa alemã de processamento e administração do solo – a Bodenverwetungs-und Verwaltungs-GmbH (BVVG) – é responsável por esta realidade. A venda de grandes áreas de terra atraiu investidores suprarregionais, sem um histórico ligado à agricultura, aumentando a especulação do preço de terras. O preço por hectare atingiu agora níveis astronómicos. Um olhar sobre o banco de dados BVVG revela compras superiores a 26 mil euros por hectare na região onde a quinta Bienenwerder está localizada. “Os preços das terras têm vindo a ser dissociados daquilo que pode ser gerado a partir da agricultura”, referiu Julia Bar-Tal. Assim, as quintas passam, eventualmente, a estar fora dos negócios, ou seja, vão, automaticamente, para uma área na qual as pessoas com capital não agrícola investem. “É um aumento virtual de valor que não corresponde à realidade”, acrescentou. Imediatamente após a reunificação da Alemanha, a terra ainda pode ser arrendada a preços acessíveis, o que foi feito, principalmente, pelas grandes cooperativas agrícolas. Hoje em dia, no entanto, os períodos de arrendamento são mais curtos e é necessário um capital substancial ao estabelecer uma quinta. Uma vez que a terra é a base de qualquer investimento futuro, a criação de uma exploração agrícola representa um enorme risco se não for assegurada a longo prazo. “Se queres começar uma quinta, precisas de ter uma grande vontade de assumir riscos, bem como um idealismo insano”, afirmou Bar-Tal.


O problema das propostas públicas


Um agricultor biológico, com experiência, está sempre bastante preocupado com as práticas de atribuição de terras da BVVG.
“Se são áreas das quais depende o teu sustento e tu não sabes quais são as outras ofertas, claro que licitas por cima”, sublinhou.
Segundo o BVVG, este sistema é o mais transparente possível. Se as propostas fossem tornadas públicas, o preço iria subir ainda mais.
Além disso, existem os chamados limites de convidados para o concurso, exclusivamente destinados a jovens ou a agricultores biológicos. Por outro lado, 80% das terras são destinadas a investidores regionais.
Os grandes investidores nem sequer compram, diretamente, as terras.
Em vez disso, compram cooperativas agrícolas, tornando-se, legalmente, agricultores regionais, autorizados a participar nos leilões de terras.
Benjamin Meise sabe, em primeira mão, da inutilidade dos concursos limitados para os agricultores mais jovens. Meise administra uma quinta perto da Bienenwerde, na qual 1.500 de 3.500 hectares são alugados através do BVVG.
Na altura em que 350 hectares foram disponibilizados através dos concursos, Meise queria licitar a terra, mas o preço mínimo era demasiado alto.
Como a terra era excelente, o agricultor manteve 70 hectares a “preços suprarregionais”, indicou.


Secas, ‘brexit’ e redução dos pagamentos diretos europeus


“Como resultado, tivemos de dispensar os funcionários e vender as máquinas. No entanto, devido às secas, ao ‘brexit’ [saída do Reino Unido da União Europeia] e à eventual redução dos pagamentos diretos da UE”, Meise espera que os preços das terras voltem a cair. 
“Os preços atingiram o seu pico”, referiu.
Como não querem ficar à espera que isso aconteça por si só, estagiários e jovens agricultores da região têm-se organizado, ao longo dos anos, no ‘Bündnis Junge Landwirtschaftfor’ (espécie de clube para os jovens agricultores, através do qual são desenvolvidas ações de formação ou demonstração).
Protestando, este grupo pode chamar à atenção do público para o “roubo de terras” por grandes investidores, forçando a prática atual de atribuição de terrenos a ser alterada. Julia Bar-Tal também faz parte deste movimento. No mínimo, gostaria de ver uma discussão sobre se as terras de Brandenburgo deveriam ser vendidas. Em alternativa, poderia imaginar um limite dos montantes de compra e de renda, tal como já acontece em França.
“O negócio seria assim muito menos atrativo para os investidores”, concluiu. 


( A versão em inglês deste artigo pode ser lida no portal de jornalismo Euractiv, em: Land speculation squeezes out young farmers in east germany)

 

 

 

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